
Einstein é popularmente conhecido como o pai da teoria da relatividade, mas recebeu o Prêmio Nobel especialmente pela descoberta da lei do efeito fotoelétrico, fato pouco conhecido pelo grande público. Além dessas duas áreas de conhecimento, Einstein tem contribuições importantes em várias outras áreas da física. Seu primeiro artigo científico foi publicado em 1901, na Annalen der Physik, sobre as "conseqüências do efeito da capilaridade", um problema de termodinâmica. Continua nessa linha de trabalho até 1905, publicando dois artigos em 1902, um em 1903 e outro em 1904, todos na Annalen der Physik. Depois vêm os magníficos trabalhos de 1905, para muitos, o annus mirabilis da sua vida científica.
O primeiro artigo deste ano miraculoso foi publicado com o título "Über einen die Erzeugung und Umwandlung des Lichtes betreffenden heuristischen Standpunkt" ("Sobre um ponto de vista heurístico concernente à geração e transformação da luz"). Entre os cinco, este foi o único considerado revolucionário pelo próprio Einstein. Em carta ao amigo Conrad Habicht, Einstein comenta: "(...) O artigo trata da radiação e das propriedades energéticas da luz e é muito revolucionário, como você verá(...)" (Stachel, p. 5). É neste artigo que Einstein formula a lei do efeito fotoelétrico, fazendo uso da constante de Planck para definir o quantum de energia do fóton, uma partícula associada à luz. Sob vários aspectos esse trabalho ocupa um lugar de destaque na história da física. Em primeiro lugar ele retoma a interpretação corpuscular da luz, uma idéia defendida por Isaac Newton e que fora abandonada depois dos efeitos de interferência observados por Thomas Young em 1801. Depois, há uma ironia nessa história. O triunfo da teoria ondulatória da luz teve seu auge com o estabelecimento das equações de Maxwell, em 1861, segundo as quais a luz era identificada com as ondas eletromagnéticas. A existência das ondas eletromagnéticas foi comprovada em 1887 através de experimentos realizados por Heinrich Hertz. Ao mesmo tempo em que gerou ondas de rádio ("ondas hertzianas"), Hertz observou que a incidência de luz sobre um objeto metálico provocava uma corrente elétrica; estava descoberto o efeito fotoelétrico!
O segundo artigo, "Eine neue Bestimmung der Moleküldimensionen" ("Sobre uma nova determinação das dimensões moleculares"), foi aceito, no mesmo ano, como tese de doutoramento na Universidade de Zurique. Nas palavras do próprio Einstein, o artigo tratava da "determinação do tamanho exato de átomos a partir da difusão e da viscosidade em soluções diluídas de substâncias neutras" (Stachel, p. 5).
O terceiro artigo, "Über die von der molekulartheoretischen Theorie der Wärme geforderte Bewegung von in ruhenden Flüssigkeiten suspendierten Teilchen" ("Sobre o movimento de partículas suspensas em fluidos em repouso, como postulado pela teoria molecular do calor"), trata do movimento Browniano, descrito pela primeira vez em 1828, pelo botânico Robert Brown ao observar que o pólen de diversas plantas dispersavam-se na água sob a forma de um grande número de pequenas partículas, as quais apresentavam um movimento aleatório (Einstein, 1956).
O quarto artigo, "Zur Elektrodynamik bewegter Körper" ("Sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento") era, segundo Einstein (Stachel, p. 5), "apenas um esboço grosseiro" sobre a eletrodinâmica dos corpos em movimento, usando uma modificação da teoria do espaço e tempo. Este "esboço" contém o primeiro trabalho sobre a teoria da relatividade restrita.
No quinto artigo, "Ist die Trägheit eines Körpers von seinem Energieinhalt abhängig?" ("A inércia de um corpo depende da sua energia?") Einstein propõe sua famosa equação E=mc2. Na carta enviada a Conrad Habicht, Einstein comenta: "Ocorreu-me mais uma conseqüência do artigo sobre a eletrodinâmica (dos corpos em movimento). O princípio da relatividade, em conjunção com as equações de Maxwell, requer que a massa seja uma medida direta da energia contida num corpo; luz transporta massa com ela." Concluindo que a hipótese poderia ser testada em corpos nos quais o "conteúdo energético é variável em grau elevado, por exemplo sais de rádio" (Pais, 1995, p. 170), Einstein mostra que não está seguro: "O argumento é divertido e sedutor, mas por tudo que conheço o Senhor pode estar rindo de tudo isso e pregando uma peça em mim" (Stachel, p. 5).
Além do inegável valor científico desses trabalhos, há um interessante contexto de natureza psico-social na elaboração dos mesmos. Trata-se da mais refinada e autônoma produção intelectual, realizada por um técnico do Departamento de Patentes de Berna, sem título de doutor e rejeitado pela comunidade acadêmica.
A partir de 1905 Einstein inicia uma frenética produtividade, com uma média superior a 5 artigos por ano. Esta média diminuiu consideravelmente depois que ele ganhou o Prêmio Nobel, em 1921. Depois dos trabalhos publicados no annus mirabilis, sua contribuição mais importante apareceu num artigo de revisão (1907) intitulado: "Über das Relativitätsprinzip und die aus demselben gezogenen Folgerungen" ("Sobre o princípio da relatividade e as conclusões tiradas dele"). Neste artigo ele introduz as primeiras idéias sobre a teoria da relatividade geral, cuja versão na forma que hoje a conhecemos só foi aparecer em 1915, na seqüência de vários artigos publicados ao longo de oito anos.
Vale lembrar, como curiosidade, que Feuer (p. 100-109) desenvolve uma argumentação segundo a qual impulsos emotivos conduziram Einstein até a denominação teoria da relatividade. Ele chama a atenção para o fato de que o escritor contemporâneo preferido de Einstein era Thorstein Veblen, que tinha uma teoria sobre o relativismo histórico. Uma assertiva originada nos trabalhos de Marx, e usada por Veblen, estabelece que as leis econômicas não são universalmente verdadeiras, mas são relativas a determinado sistema social. Para reforçar parcialmente o ponto de vista de Feuer, é interessante observar que em artigo comemorativo ao septuagésimo aniversário de Einstein, Sommerfeld (Shilpp, p. 99-105) destaca a má escolha do nome teoria da relatividade, chamando a atenção para o fato de que no primeiro trabalho de Einstein, "Sobre a Eletrodinâmica dos Corpos em Movimento", o conceito central é a independência das leis naturais do ponto de vista do observador, e não a percepção relativa de comprimento e duração. Em 1928, o próprio Einstein reconheceu que "princípio da covariância" teria sido uma denominação mais apropriada que "teoria da relatividade". Teriam o ambiente sócio-cultural e o zeitgeist da sua geração o influenciado nesse sentido? Feuer tenta convencer-nos que sim. O caráter emocional do termo "relatividade" foi tão forte a ponto de justificar a denominação, ainda mais artificial, de "teoria da relatividade geral", ao invés de "teoria da gravitação".
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